Nota do editor: A publicação desse texto foi solicitada por um usuário do Portal do Arquivista, Nei Silveira, por email.

No dia 12 de janeiro, o ministro da justiça José Eduardo Cardozo, compareceu ao Arquivo Nacional para se reunir com a direção-geral do órgão, com a Associação dos Servidores do Arquivo Nacional – ASSAN e com o Movimento pela Permanência do Arquivo Nacional na Casa Civil, formado por entidades representativas da comunidade acadêmica e arquivística. Nessa ocasião o ministro afirmou um “compromisso do Ministério na promoção da democracia, aí incluindo o acesso aos documentos”. Ressaltou ainda “o papel do Arquivo Nacional como órgão de estado”, e garantiu a intenção do Ministério da Justiça em dispensar atenção especial à instituição.

A ASSAN considera que as boas intenções do ministro Cardozo, com relação ao compromisso do ministério com a democracia, encontrarão dificuldades no Arquivo Nacional, considerando que os vínculos do diretor-geral, Jaime Antunes da Silva, com personagens que apoiaram a ditadura militar e hoje estão dentro da instituição como conselheiros da Associação Cultural do Arquivo Nacional – ACAN. A ACAN, composta por membros do antigo SNI, participa hoje da captação de recursos para financiamento de projetos do Arquivo Nacional, como o centro de referência das lutas políticas no Brasil 1964-1985 – Memórias Reveladas, que tem por objetivo reunir informações sobre documentos do período da ditadura militar.

A presidenta Dilma Rousseff afirmou em sua primeira reunião ministerial ocorrida em 14/01/2011 que sua administração terá como característica “uma gestão com transparência, princípios éticos e republicanos”. A permanência do senhor Jaime Antunes na direção-geral da instituição é uma mancha no Ministério da Justiça e se contrapõem às declarações do ministro Cardozo no que se refere à democracia, considerando suas relações com aqueles que endossaram a prática de agentes do estado que perseguiram e assassinaram militantes políticos.

A convivência e a conivência com aqueles que estiveram na linha de frente de perseguições políticas durante o período recente da ditadura em nosso país não se coaduna com os princípios éticos do republicanismo e da democracia propalados pelo governo. Primordialmente, pessoas que se opõem à salvaguarda dos direitos humanos não podem ser as responsáveis por angariar recursos para a preservação dos documentos e para a ampliação do acesso às informações sobre o governo de exceção daqueles anos. A falta de transparência na gestão dos recursos levantados pela ACAN, associadas às críticas da revista Carta Capital (nº 609 – agosto de 2010 – páginas 20 e seguintes)de uma relação obscura entre a ACAN e a direção do Arquivo Nacional tornam insustentável o modelo de financiamento externo vigente no órgão.

Todos sabemos da sensibilidade política que o tema da abertura dos arquivos da ditadura desperta na sociedade, e o Arquivo Nacional não está ao largo disso. Há hoje uma disputa de interpretações que leva a diferentes orientações em instituições arquivísticas e lamentavelmente serve de pretexto para que se crie nesses órgãos mecanismos de controle e restrição, favorecendo a cultura do segredo e permitindo eventuais manipulações. É de fundamental importância estabelecer uma política séria de acesso à informação no Brasil, que estabeleça a abertura da documentação como norma geral e livre o país de uma “tradição do sigilo”. Especificamente no Arquivo Nacional faltam normas claras e procedimentos unificados que favoreçam o acesso, ausência essa que só fortalece a cultura do silêncio. No fim do ano passado , sucessivas reportagens – Carta Capital, O Globo, Folha de São Paulo, Época, etc. – denunciaram interferência ou controle de caráter político sobre o acesso a informações públicas no Arquivo Nacional que levaram ao desligamento dos professores Carlos Fico e Jesse Jane do projeto Memórias Reveladas.

Neste momento de transferência do Arquivo Nacional para um ministério que pretende cobrar do órgão um papel republicano, manter no cargo um diretor que está há quase 20 anos no comando está em contradição com a própria idéia de república, de limitação de poderes e de impedir a perpetuação autocrática de um agente público numa esfera de poder. Em um país que não permite a reeleição indefinida do seu mais alto mandatário, independentemente de sua aprovação pela população, temos um diretor-geral que foi nomeado pelo ex-presidente Collor de Mello e cuja gestão atravessou seis mandatos presidenciais. Este fato é reproduzido em “efeito cascata” para demais cargos e chefias, gerando uma administração que está fossilizada em relações de poder viciadas.

Os servidores são contra a censura que existe dentro da própria instituição, contra a perseguição aos representantes das entidades, contra a continuidade da atual gestão e, por isso, aprovaram em assembleia, no dia 11 de janeiro, a reivindicação pela substituição da direção-geral e a cobrança desta reivindicação ao ministro José Eduardo Cardozo.

Lutamos por uma gestão democrática, que não utilize práticas de coação, censura e assédio moral, que garanta condições dignas de trabalho para servidores e colaboradores terceirizados, que não persiga os diretores da associação dos servidores e possa conviver harmoniosamente com críticas e com o pensamento diverso.

Recentemente o Arquivo Nacional foi incumbido do desafio de preservar e abrir ao acesso público os arquivos da ditadura. Apesar disso, no Arquivo Nacional ocorrem todas as características de uma administração autoritária: censura, restrição à liberdade de expressão, perseguição aos presidentes e diretores desta associação (com pedidos de prisão e processos administrativos), assédio moral, manipulação de gratificações temporárias, falta de respeito às entidades representativas (associação e sindicato) e ao direito de greve, descumprimento de compromissos firmados. O mais recente episódio deste estado de exceção foi a edição de portarias que estabelecem a censura e prévia aprovação pelo diretor-geral de todo e qualquer trabalho acadêmico apresentado por servidor do Arquivo Nacional, a serviço ou não.

Por essas e muitas outras razões a Associação dos Servidores do Arquivo Nacional solicita a imediata substituição da direção-geral do Arquivo Nacional, com o objetivo de restabelecer a democracia na gestão da instituição.

ASSOCIAÇÃO DOS SERVIDORES DO ARQUIVO NACIONAL – ASSAN

Pela substituição da Direção-Geral do Arquivo Nacional, em defesa da Democracia

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