A quem pertence a carta original de 1808 assinada por Dom João VI determinando a abertura dos portos brasileiros às nações amigas? O presidente do Arquivo Público da Bahia , Ubiratan Castro (Nota do Editor do Portal do Arquivista: Ubiratam Castro é presidente da Fundação Pedro Calmon, ao qual o Arquivo Público da Bahia, cuja diretora é Maria Teresa Matos, está vinculado), afirma que o documento foi emprestado ao Arquivo Público Nacional, no Rio de Janeiro, e nunca mais voltou, apesar das reclamações baianas ao longo do século 20.

Nota do editor: O texto abaixo é reprodução de uma reportagem da revista Época e não retrata, necessariamente, a opinião ou versão da Fundação Pedro Calmon e/ou Arquivo Público da Bahia.

Agora, por ocasião do bicentenário da chegada da Família Real ao Brasil, ele volta a lutar pela devolução do material. Jaime Antunes, diretor do Arquivo Nacional, não questiona os dados históricos listados por Castro, mas diz que a reivindicação do colega baiano não procede. Antunes afirma que não devolverá documento algum.

Historiador da Universidade Federal da Bahia, Castro prometeu pedir pessoalmente a intermediação do presidente Lula na segunda-feira 28, durante as comemorações oficiais do bicentenário da abertura dos portos, em Salvador (BA). “Eu quero a carta de volta à Bahia. Além da alegação histórica, tenho argumentações técnicas. O documento foi elaborado e assinado aqui”, diz Castro. O diretor do Arquivo Nacional, no Rio, tem outra interpretação: “O documento tem relevância nacional e está incorporado ao acervo histórico da União.”

Desde 1887, quando o decreto original seguiu da Bahia para o Rio, a entidade responsável pela preservação da história baiana usa uma cópia como referência histórica. Nos primeiros anos após o empréstimo, o caso aparentemente caiu no esquecimento dos baianos. Só em 1936 o então diretor do Arquivo Público do Estado, Alfredo Vieira Pimentel, deu-se conta da lacuna no acervo do órgão e enviou uma missão ao Rio para resgatar os escritos de D. João VI. Os resultados da investida, conforme relatório minucioso elaborado por Pimentel, foram considerados “vitoriosos”, pois os baianos conseguiram reaver parte dos documentos emprestados em 1887. O decreto oficial da abertura dos portos, porém, não estava entre eles.

Uma nova tentativa de resgate foi feita em 1948, segundo o material reunido por Ubiratan Castro, mas essa segunda missão também falhou: a carta original assinada por D. João VI continuou no Rio. Depois disso, autoridades baianas nunca mais voltaram a lutar pela devolução.

A historiadora Rita Rosado pesquisou o contencioso Rio-Salvador. Ela diz que o Arquivo Público baiano custodia as ordens régias expedidas durante os 35 dias em que o príncipe permaneceu na Cidade do Salvador. Por isso, entende como “natural” guardar também o referido decreto. Dos 13 anos que a corte de Dom João VI esteve no Brasil, o ato de abertura dos portos foi o mais importante do seu reinado.

Ubiratan Castro quer empenho político pela devolução. Além de falar com Lula, ele pedirá apoio oficial do governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), que, por ironia, é carioca. “O acervo do Museu do Louvre, na França, está recheado com documentos tomados por empréstimo pelo então imperador, Napoleão Bonaparte, nunca devolvidos aos verdadeiros donos”, afirma.

Antunes se defente: “Não me parece pertinente a alegação de Ubiratan. Nesse caso não pode ser aplicado o princípio da territorialidade. O fato é de abrangência nacional, embora tenha sido assinado em terras soteropolitanas. Se o presidente da República assina uma lei na Bahia, não significa que ela tenha vigência apenas naquela localidade.” Jaime Antunes diz entender os “motivos emocionais, de preservação da história e defesa da terra baiana que movem Castro”, mas sustenta que sua a reivindicação não encontra amparo legal.

A disputa parece ter contagiado outros baianos. Temendo perder uma valiosa tela de Candido Portinari, o presidente da Associação Comercial do Estado, Eduardo Moraes de Castro, disse que só irá emprestá-la à Fundação Mariani, no Rio, se conseguir garantias de retorno da obra por parte do governador Jaques Wagner. A Fundação Mariani requisitou a obra A Chegada da Família Real a Bahia, datada de 1952, para as comemorações dos 200 anos da vinda da família real portuguesa para o Brasil. Até agora não obteve resposta.

Fonte: Revista Época

Rio e Salvador brigam pela posse do documento original da abertura dos portos

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