Silvestre Lacerda – Diretor do ANTT
Cinco milhões de imagens do arquivo da Inquisição de Lisboa vão estar disponíveis on-line. O processo de recuperação e digitalização integral dos 17.980 processos, referentes ao período entre 1536 e 1821, ainda vai demorar cerca de três anos a estar completo, mas constitui, sem dúvida, uma boa notícia para os investigadores.
O anúncio foi feito pelo diretor do Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Silvestre Lacerda. “Consideramos que a disponibilização destes processos é uma prioridade, já que são os mais consultados e os mais procurados por investigadores nacionais e estrangeiros.” O custo do projecto foi avaliado em um milhão de euros, mais de metade financiados pela REN (Rede Eléctrica Nacional), o mecenas desta iniciativa.
A Inquisição, como tribunal eclesiástico, perseguiu e condenou aqueles cujas acções e convicções diferiam das leis da Igreja católica. De acordo com o historiador António Borges Coelho, a Inquisição de Lisboa é especialmente relevante no contexto português, já que “as comunidades estrangeiras estavam sediadas em Lisboa, a liberdade de pensamento emergia mais facilmente, os livros clandestinos chegavam mais facilmente a Lisboa”. Era mais fácil encontrar na capital as principais vítimas da Inquisição: os judeus, as bruxas, os mancebos, os homossexuais, explica o historiador. “Os processos da Inquisição de Lisboa são especialmente ricos por isso.”
O escritor e dramaturgo António José da Silva foi uma das vítimas do Santo Ofício. Preso e torturado pelos membros da Inquisição por ser judeu, acabou por ser queimado num auto-de-fé. Este é apenas um dos muitos processos que vão estar acessíveis a partir de qualquer computador.
Para António Borges Coelho, a digitalização destes processos “é uma notícia magnífica”, mas não é suficiente para reavivar na memória que “milhares de pessoas passaram pela humilhação dos autos-de-fé”. E lança a questão: “Para quando uma oliveira nas praças portuguesas, em Lisboa, Évora, Coimbra, onde mais de 2000 pessoas foram queimadas por expressarem opi-niões diferentes?”.
Fonte: Público.pt