A Setúbal antiga não seria tão conhecida tal como é, caso não tivesse existido um fotógrafo chamado Américo Augusto Ribeiro. Falecido há 15 anos, com 86 de idade, deixou um legado valiosíssimo, objecto de preservação e digitalização no arquivo municipal fotográfico Américo Ribeiro, na Casa Bocage.
Observar e interpretar as imagens captadas pelas objectivas fotográficas das máquinas de Américo Ribeiro é, antes do mais, um duro exercício de memória, não ao alcance de muitos, mesmo entre pessoas de meia-idade.
O antes e o depois desta cidade e concelho, só podem mesmo ser comparados graças às imagens conseguidas pelas objectivas de Américo Ribeiro, porque são esses documentos fotográficos que retraram literalmente o que era, e como era esta cidade, durante a maior parte do Século XX.
E é esse trabalho, de recuperação e preservação de todo o vasto espólio fotográfico, que está sendo desenvolvido desde há sete anos na Casa Bocage. “Entre 2000 e 2003, foi realizada a primeira etapa do trabalho de conservação, com a observação e pré-inventário”, começou por explicar a «O Setubalense» Bruno Ferro, técnico responsável por este arquivo municipal.
“A partir desse estudo, ficamos a saber exactamente os tipos de processos fotográficos e suas quantidades, o que permite delinear planos de tratamento a aplicar a cada uma das tipologias”, sendo que existem neste espólio, composto por 142 mil espécimes fotográficos, entre outros, negativos em gelatina em vidro, negativos em película de acetato de celulose a preto e branco, negativos em nitrato de celulose e provas foto-mecânicas. “Cada material requer o seu tratamento”, esclarece o técnico.
A par do trabalho técnico, a memória dos voluntários deste projecto é factor essencial, para identificar locais e confirmar datas. Raul Gamito Gomes, José Manuel Pedrosa e Rogério Vaz de Carvalho são os voluntários encarregues de observar fotos e identificá-las, através do computador. Este projecto de recolha de memórias resulta de uma parceria do Arquivo Municipal Fotográfico Américo Ribeiro e do Museu do Trabalho Michel Giacometti, e encontra-se em fase de planificação.
Paralelamente, Alberto Sousa Pereira, também voluntário, faz tratamento de dados, informatizando os livros de registo de Américo Ribeiro e inserido na base de dados, as fichas de pré-inventário. Também foi constituído um centro de recolha de memórias orais a partir das imagens. “Nesse sentido, foi integrado no grupo de voluntários a socióloga Edite Barreira”, explicou Bruno Ferro. Este projecto conta ainda com o trabalho da antropóloga Maria Miguel Cardoso.
“Todos os trabalhos de conservação e descrição nesta colecção fotográfica, euquadram-se no duplo objectivo deste arquivo municipal, e que são a preservação dos espécimes fotográficos, e a garantia da correcta acessibilidade das imagens por parte do domínio público”, resume o técnico.
SENHOR Este fotógrafo, de baixa estatura mas grande em personalidade e profissionalismo, nasceu em Setúbal a 1 de Janeiro de 1906, teria completado há dias 102 anos de idade. Faleceu a 10 de Julho de 1992, com 86 anos. Deixou viúva, a dona Ernestina, que acabaria por falecer pouco tempo depois. O casal não deixou um único filho.
Enquanto profissional, manteve durante décadas o estabelecimento comercial, a célebre Foto Cetóbriga, no Largo da Conceição, n.º 9, loja que pontualmente fechava porta sempre que Américo Ribeiro precisa de fotografar no exterior. O casal residia num primeiro andar, mesmo ao lado, na Rua Afonso Palla.
Dizem os registos sobre este vulto setubalense que a sua primeira máquina fotográfica custou-lhe 60 escudos, há cerca de 80 anos. Mais do que um simples comerciante de produtos fotográficos, Américo Augusto Ribeiro foi um eterno amante pela arte que abraçou. E essa paixão permitiu termos herdado um espólio fotográfico de que Setúbal e os setubalenses bem se podem orgulhar.
Fonte: O Setubalense